14 de maio de 2014

Pra Não Dizer que Não Falei de Algumas Misses*

Dizem que o Brasil tem 190 milhões de técnicos de futebol. Este número varia de acordo com a atualização da população do país. Houve um tempo em que tínhamos também 60 milhões de especialistas em misses. A população brasileira era bem menor. O que eu descobri esta semana foi que todos esses 60 milhões de especialistas continuam em atividade. E muitos deles me escreveram depois que dediquei a coluna do último domingo às minhas lembranças dos certames — era assim que a gente dizia naquela época — que escolhiam as misses Guanabara, Brasil, Universo...
A maioria reclamava de o texto não citar Marta Rocha. Foi o que fez, por exemplo, Wilméa Silva Ramos: “Fiquei surpresa ao notar que você escreveu sobre as misses do Brasil e não citou a mais famosa de todas: Marta Rocha. Marta Rocha foi sucesso internacional pela beleza, pela simpatia, pelo lindos olhos e pelo lindo sorriso. O sucesso alcançado por Marta Rocha é que justifica o concurso de misses ainda existir no Brasil. Gostaria de saber por que você a esqueceu!!!”
Não me esqueci de Marta Rocha. Ninguém se esquece de Marta Rocha. Acontece que escrevi sobre minhas lembranças, e, para mim, o concurso (ou certame) só começa quando é realizado no Maracanãzinho. Marta é do tempo de desfiles no Hotel Quitandinha, em Petrópolis. Quando me dei conta de mim, Marta Rocha já era “a eterna Miss Brasil”. Eu me lembro que ela se casou com Ronaldo Xavier de Lima, que era da turma da Miguel Lemos e que, de vez em quando, a levava para comer uma pizza brotinho no Tommy’s, ali na esquina de Miguel com Ayres Saldanha. Eu me lembro que, em seu apartamento na Avenida Atlântica, já separada, Marta transformou um cômodo em boate. Eu me lembro que ela levou um golpe financeiro das Casas Piano, se aposentou da vida social e foi morar em Volta Redonda.
O leitor Oleg Franco também não perdoa: “Penso que você foi injusto com Miss Vera Lúcia Couto dos Santos. Sim, foi ela que em 1964 quebrou todos os tabus, tornando-se a primeira negra a se classificar em um certame (viu como se falava assim?) de beleza internacional. Vera fez o mais arrebatador desfile no Maracanãzinho com os seus famosos pivôs que faziam a platéia gritar ‘olé, olé!’. Seu traje típico era o ‘Samba, sinfonia de três raças’, de Evandro de Castro Lima. Seu vestido de gala tinha 1.400 pérolas. Ela ficou em terceiro lugar no Miss Beleza Internacional, em Long Beach, onde também foi eleita Miss Fotogenia. Foi a primeira ‘colored’, como se dizia na época, a se classificar. Depois dela, quatro negras já foram Miss Universo.”
Eu apenas quis destacar o pioneirismo de Aizita Nascimento (se bem que ela nem foi pioneira, como se verá daqui a pouco). Mas é claro que eu me lembro de Vera Lucia Couto. Eu me lembro que ela foi a inspiração de João Roberto Kelly para compor a marchinha de carnaval “Mulata bossa nova”. Eu me lembro que ela ganhou o Miss Renascença em 1965, quando a favorita era Esmeralda Barros. Eu me lembro que, até pouco tempo, Vera Lucia trabalhava na Riotur. Eu me lembro que, no Miss Brasil, o Maracanãzinho dividiu-se entre Vera, a Miss Guanabara, e Angela Vasconcellos, a representante do Paraná, e gritava: “Guaraná!”. Eu me lembro que a Paraná ganhou. Eu me lembro que Angela Vasconcelos usava óculos.
E, para encerrar esse papo Catalina, vários leitores me corrigiram, lembrando que a primeira miss negra foi Dirce Machado, que, em 1960, tirou quarto lugar no Miss Guanabara.

*Texto retida do Blog do Xexéu, com data de 21 de setembro de 2011.

http://oglobo.globo.com/cultura/xexeo/?a=916&periodo=201109

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