20 de abril de 2016

A Recatada Passarela da Miss Brasil 1960

Alçada ao posto máximo da beleza nacional, Gina MacPherson não pediu a paz mundial, como tantas outras coroadas

No dia 11 de junho de 1960 - um sábado temperado de meio de outono -, todos os televisores do país estavam ligados. Em frente a eles, amontoavam-se pais e mães de família, crianças e adolescentes, além dos parentes e vizinhos que, por ventura, não possuíssem aparelho televisor em casa. Era noite de Miss Brasil e, naquela época, o concurso causava comoção similar a uma final Brasil x Argentina da Copa do Mundo. Do outro lado da tela, 25 mil pessoas fervilhavam no Maracanãzinho, enquanto Gina MacPherson caminhava elegantemente com um vestido branco de alcinha e saia drapeada esvoaçante, que fizeram com que os jornalistas da época a apelidassem de "O Cisne". Ela não lembra muito bem do momento em que foi alçada ao patamar mais alto de beleza feminina do país, mas se recorda da cegueira momentânea causada pelos holofotes e da sensação de embriaguez quando todas as candidatas correram para abraça-la.
Poucos dias depois, Gina, então com 19 anos, embarcou para Miami, onde disputaria a faixa de Miss Universo e amargaria uma derrota. Com inglês fluente ensinado pela mãe americana e pelo pai escocês e com um corpo longilíneo, ela era tida como a favorita do certame, mas acabou ficando em sexto lugar.
- Eu nem tinha as tais duas polegadas a mais de quadril que haviam desclassificado a Marta Rocha. Eles chegaram a tirar minha foto com a coroa de Miss Universo, mas quem acabou ganhando foi a americana Linda Bement - conta uma Gina ainda esbelta aos 73 anos, e que até hoje caminha como se tivesse uma pilha de livros sobre a cabeça.
Na verdade, o único rancor que ela guarda daquela época foi justamente o rumor que surgiu para explicar o sexto lugar no Miss Universo. Cada candidata contava com um motorista universitário, que levava as moças para os compromissos externos. Na festa da premiação, Gina deu as mãos e dançou com o seu cicerone e, fotografada, foi acusada de ter perdido a coroa devido a um suposto namorico.
- Fiquei muito chateada porue não era verdade. Eu namorei e aproveitei muito essa época, mas não com ele. Quis voltar direto para o Brasil, porque tive um outro aborrecimento com o cônsul brasileiro, que querida que eu desfilasse de maiô no aeroporto de Miami. Eu era miss, não vedete - frisa.
De voltas para casa, Gina conta que viveu "um ano de Cinderela", antes de decidir se afastar dos holofotes e se dedicar integralmente a sua futura família. Naqueles meses, ela ganhou roupas e joias de senhores mais velhos que se plantavam na porta do Hotel Serrador (o hotel das misses). Certa vez, chegaram da Alfândega caixas de bombons e cartas de amor de um admirador americano que Gina nunca chegou a conhecer. O que muitos ignoravam é que, ao contrário das outras moças que brincavam de miss na frente do espelho, Gina nunca tinha pensado em se candidatar até menos de um mês antes daquele 11 de junho.
Recém-saída da escola, ela foi trabalhar como recepcionista da companhia aérea britânica Boac, que funcionava num escritório envidraçado na Cinelândia. Um belo dia, apareceu um rapaz que se prostrou na calçada por três dias seguidos. Ele era um olheiro do Botafogo e convidou a moça para concorrer a Miss Guanabara pelo clube.
- O Miss Guanabara era muito mais concorrido. Uma moça chegou até a dizer que eu não poderia participar, porque até o meu papagaio falava inglês - diverte-se.
- Mas isso foi um rio que passou na minha vida. Não meu acho fotogênica e, geralmente, não dou entrevistas - justifica ela sobre as negativas aos muitos pedidos da equipe do GLOBO-Niterói, por cerca de nove meses.
Filha de um importador de uísque, Gina nasceu em Icaraí e passou sua infância entre o Rico Cricket, a piscina do Clube de Regatas e os estudos ministrados pela mãe, uma mulher prática que ensinou às três filhas o valor da independência. Talvez por isso, Gina preferia retocar seu portão sozinha, cuidar do seu jardim, em São Francisco, e fazer ela mesma suas unhas e o cabelo. Ela acredita que tenha escolhido uma rotina pacata por causa do frenesi vivido no período dos concursos. Passada essa fase (nem a faixa de Miss Brasil restou: ela foi roubada há alguns anos, na Inglaterra), ela voltou com o ex-namorado e oficial da Marinha Ademar Garcia (falecido há duas décadas), casou-se, teve três filhos que a chamam de mommy (mamãe, em inglês), cinco netos e espera seu primeiro bisneto. Gina era tão assediada que o casal, quando ia ao cinema, "entrava e saia no escuro", lembra.
- Aproveitei aquele ano, e não em arrependo de nada. Meu temperamento não é o do palco iluminado. A velha guarda me reconhece, mas quando a pessoa não tem certeza, nem digo quem eu sou - enfatiza, sempre enérgica, do alto do seu 1,73 de altura e por trás de seus olhos azuis-turquesa.
Hoje, Gina passa seus dias entre caminhadas e aulas de Pilates, saladas ("sou comportada") e seu grupo de amigas. É com elas que a ex-miss Brasil viaja o mundo todo e largatixeia na piscina do Sailing Club.
- Só tomo remédio para pressão desde os 32 anos, mas não sinto uma dor no corpo. Meu prazer foi ter viajado para mais de 20 países. Mas não moraria em outro lugar, não. Só sou feliz em Niterói - vaticina.

Fonte: O Globo - 06/05/2014 










 

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